quinta-feira, dezembro 22, 2005

"Um dia, a maioria de nós irá separar-se..."

Um dia a maioria de nós irá separar-se..

Sentiremos saudades de todas as conversas jogadas fora, das descobertas que fizemos, dos sonhos que tivemos, dos tantos risos e momentos que partilhamos.
Saudades até dos momentos de lágrimas, da angústia, das vésperas dos finais de semana, dos finais de ano, enfim... do companheirismo vivido.
Sempre pensei que as amizades continuassem para sempre. Hoje não tenho mais tanta certeza disso.
Em breve cada um vai para seu lado, seja pelo destino ou por algum desentendimento, segue a sua vida.
Talvez continuemos a nos encontrar, quem sabe...nas cartas que trocaremos. Podemos falar ao telefone e dizer algumas tolices...
Aí, os dias vão passar, meses...anos... até este contacto se tornar cada vez mais raro.
Vamo-nos perder no tempo....
Um dia os nossos filhos verão as nossas fotografias e perguntarão:
«Quem são aquelas pessoas?»
Diremos...que eram nossos amigos e...... isso vai doer tanto!
«Foram meus amigos, foi com eles que vivi tantos bons anos da minha vida!»
A saudade vai apertar bem dentro do peito.
Vai dar vontade de ligar, ouvir aquelas vozes novamente......
Quando o nosso grupo estiver incompleto... reunir-nos-emos para um último adeus de um amigo. E, entre lágrima
abraçar-nos-emos.
Então faremos promessas de nos encontrar mais vezes daquele dia em diante.
Por fim, cada um vai para o seu lado para continuar a viver a sua vida, isolada do passado.
E perder-nos-emos no tempo......
Por isso, fica aqui um pedido deste humilde amigo: não deixes que a vida passe em branco, e que pequenas adversidades sejam a causa de grandes tempestades....
Eu poderia suportar, embora não sem dor, que tivessem morrido todos os meus amores, mas enlouqueceria se morressem todos os meus amigos!"

Fernando Pessoa
Mandaram-me este texto junto com uma mensagem de Boas Festas.
Revejo-me e sinto cada uma destas linhas... Só um génio como Fernando Pessoa para retratar sentimentos de forma tão simples e sentida... Afinal, escrever até parece fácil!
Lembrei-me de muitos dos meus amigos, alguns que provavelmente nunca mais vou voltar a ver, porque as nossas vidas tomaram de repente rumos completamente distintos...
Confesso que me emocionei ao lê-lo...
Quem disse que os homens não choram?

segunda-feira, dezembro 19, 2005

As missas do Parto

Virgem do Parto, Oh! Maria
Senhora da Conceição
Dai-nos as Festas Felizes
Na Paz e na Salvação


Esta quadra, é uma das que é cantada na abertura e no encerramento das Missas do parto, uma das mais curiosas tradições do Natal da Madeira.
Independentemente do significado religioso que qualquer missa tem, as Missas do Parto têm um outro significado, de carácter mais pagão e até de certa forma lúdico, pelo que encerram de convivio e de alegria.
As chamadas Missas do Parto, destinam-se a comemorar os nove meses de gravidez da Virgem Maria, começam por isso mesmo nove dias antes do natal e culminam com a Missa do Galo, destinada a celebrar o Nascimento de Jesus, na Noite de Natal.
São celebradas cedo pela manhã, cerca das seis horas, para não perturbarem a labuta diária do povo trabalhador, em especial nas zonas rurais, onde o dia de trabalho começa bem cedo...
Mas as minhas recordações vão bem para além da celebração liturgica... lembro-me em especial, do cacau quente bebido logo após a missa, dos cortejos de amigos que à saida da igreja se divertiam a bater em todas as portas, acordando todos os que a essa hora ainda dormiam...
E essa barulheira das campainhas das portas e dos cães a ladrar era por todos bem aceite, com um sorriso, parece que até estavam à espera desse acordar para dar inicio às festas, e muitas vezes diziam com ar meio a brincar: "Ah, agora já lembra o Natal!".

São as missas do Parto em conjunto com a "morte do porco", a cozedura das broas, dos bolos de mel, as "luzinhas" das ruas, o cheiro e o sabor adocicado dos licores, o construir da "lapinha" e do "pinheiro", o "deitar da carne de vinho e alhos" que na realidade lembram o Natal neste Portugal plantado no Atlântico.

A todos os que por aqui passarem, um Santo Natal, ou, como aqui se diz, que tenham umas Boas Festas na Paz do Senhor!

domingo, dezembro 04, 2005

O Café Apolo

O Café Apolo, no centro da cidade do Funchal ocupa uma parte importante das minhas recordações da juventude... Foi lá,no café Apolo que passei uma parte do tempo da minha adolescência, tardes e tardes inteiras, a estudar ou simplesmente em amena conversa com amigos...

O Café Apolo, ainda existe e ainda possui uma das melhores "bicas" da cidade; infelizmente a qualidade das queijadas da madeira, dos cornucópios e dos pastéis de nata, já não é a que era, fruto talvez das transformações que entretanto se deram...Fez no passado dia 1 de Dezembro, 60 anos de existencia, é talvez o último dos cafés tradicionais da cidade que marcaram a década de 60, e o único que felizmente, ainda permanece mais ou menos intacto; outros como "A Indiana", a "Penha d´Águia", a "Felisberta", o "Minas Gerais" e até o "Golden Gate" (que foi- e bem!- recentemente reactivado) não tiveram a mesma sorte e não conseguiram resistir ao que chamamos de progresso.

Curiosamente, na mesma semana em que o Café Apolo fazia 60 anos, outro dos cafés típicos da cidade era demolido, o "Minas Gerais"; situado numa das mais famosas esquinas da cidade, a poucos metros da residência Oficial do Presidente do Governo Regional, nem isso o salvou.... Irá dar lugar a um prédio de escritórios e sabe-se lá que mais...

Por quanto tempo conseguirá o Café Apolo resistir?

segunda-feira, novembro 21, 2005

O TGV e o Comboio do Monte...


Decidiu este governo andar com o TGV para a frente... Como já vem sendo hábito, concentrou tudo em Lisboa, a muy nobre Capital do Império, esquecendo que o Porto também tinha interesses na ligação a Vigo e por aí à Galiza....
Lembra-me esta questão um outro facto passado e há muitos anos... o comboio que existia aqui na Madeira, entre o Funchal e o Terreiro da Luta...
Tem a Câmara Municipal, feito algum esforço para que o "Comboio do Monte", não caia no esquecimento mas, com poucos apoios e sem um verdadeiro empenhamento do Governo, é um trabalho dificil e por vezes inglório... A continuar desta forma, o pouco que resta do "Comboio do Monte acabará por ser "engolido", ficará talvez um nome numa rua "O Caminho do Comboio" ou o "Caminho de Ferro" e algum saudosismo...
E pensar que "umas migalhas" dos milhões que custará o TGV, eram suficientes para que esta memória não se perdesse de vez!

quinta-feira, novembro 10, 2005

Ti Bento

Vou emigrar! Vou emigrar!-disse o Artur de si para consigo sentado na tripeça de til preto, solando umas botas de atanado.
Não se sentia realizdo em suas ambições. No termo da segunda infância começou como aprendiz de sapateiro a receber do trabalho duas patacas e com elas já fazia um figurão. Mas sempre notava um vazio, uma insuficiência em sua vida de rapazinho. Raramente ferrava com companheiros do lugar. A sua vida assemelhava-se ao raiar da manhã entrando Maio com as reverberações vermelhentas a pintarem a cal da parede do quarto, explodindo de criação na luz do Sol, génese do mundo. Dentro dele alguma coisa o impelia sem saber para onde, nem para quê.

Torna Viagem
Horácio Bento de Gouveia
Horácio Bento de Gouveia, foi quanto a mim, o maior escritor madeirense contemporâneo. Figura humilde e simples, escritor por vocação e profundo conhecedor da realidade da Madeira no século XX, os seus livros retratam a vida da sociedade madeirense, presa nessa época a uma emigração crescente em que a Venezuela e a África do Sul constituiam verdadeiros "El-Dorados" e miragens, objectos de sonhos e de desejos...
Horácio Bento, retratou essa realidade como ninguém, de forma sentida onde as lágrimas da despedida no cais eram rápidamente aumentadas pela saudade e logo a seguir, amplamente compensadas pela alegria do regresso ainda que temporário à terra.
O Dr Horácio Bento (Ti Bento, como nós lhe chamavamos...), leccionava Português no Liceu do Funchal (Jaime Moniz) e quiz o destino que nesse já longínquo ano de 1973/74, ele fosse chamado a dar aulas de "Organização Política e Administrativa da Nação" e por consequência, meu professor... Era um Homem franzino, de ar frágil, com um sentido de humor muito particular, apreciador da Beleza e conhecedor profundo da natureza humana do Ilhéu.
Dele recordo em especial os dias seguintes ao 25 de Abril de 1974...
Na primeira aula a seguir ao 25 de Abril, disse aquilo que sentia e estava há muito voluntáriamente silenciado e terminou, afirmando que as aulas de "Organização Política e Administrativa da Nação" tinham terminado, porque esta Nação não podia continuar a ter esta Organização...
Recordo-o com saudade, e só lamento que a divulgação da sua escrita não tenha sido efectuada de forma mais intensa em todo o espaço português.

quinta-feira, novembro 03, 2005

Políticos profissionais?

Subitamente, esta pré-campanha para as eleições presidenciais, tem girado à volta de saber quem é ou quem não é político profissional!
Como se isso nos interessasse muito...
Eu quero é que quem for eleito cumpra o seu dever da forma mais correcta possível!
Agora se é profissional ou não da política isso interessa para alguma coisa? Contribui para o país sair do buraco em que os tais políticos "ditos" profissionais o meteram?
Pela forma como temos sido governados, parece é que nenhum deles é minimamente profissional...

Deixem-se de discussões da treta e façam algo pelo país que é para isso mesmo que nós os elegemos! Bom quanto a mim ainda não sei se vou votar... não me revejo em nenhum destes candidatos...

segunda-feira, outubro 24, 2005

A minha tia Beatriz

A minha tia Beatriz, era uma bebedoura de café como nunca vi igual!
De manhã cedo, logo que se levantava, pegava numa cafeteira de ferro e fazia litro e meio de café “do bom”, que depois era bebido vagarosamente, chávena a chávena, com uma boa dose de açúcar “de cana”, porque “amarguras, já bastam as da vida”...
O cheiro intenso, activo do café era uma constante naquela casa e constitui ainda hoje uma das recordações mais fortes da minha infância; à criança que eu era, na altura, estava completamente vedado a bebida do café, mas a minha tia Beatriz, de vez em quando sorrateiramente quando a minha avó estava ausente, molhava um pouco de pão no café e dizia “Prova lá que isto não faz mal e até aquece a alma!” e eu, saboreava aquele naco de pão, com a delícia que o fruto proibido contém...
Foi com a minha tia Beatriz que ouvi as primeiras palavras em inglês, ditadas apenas pelo som... Lembro-me de quando a energia faltava, ela levantava-se dirigia-se ao quadro electrico junto à porta de entrada e dizia-me com ar entendido: “Deixa ver se os fiúsos da parede estão bons”... Demorou alguns anos até eu perceber que “fiusos” era a maneira que a tia Beatriz encontrara para a palavra “Fuse” e, de vez em quando, no meio da conversa, lá ela deixava escapar um “gates olrrite” a versão adaptada de “That’s all Right”...
Ah! Não me lembro da sua morte... apenas de me terem dito que a tia “tinha ido ter com Jesus” e que nunca mais a ia ver... De um momento para outro, desapareceu o cheiro a café, o naco de pão ensopado, o “gates olrrite” e eu, corri para o quarto e chorei....
A perda de alguém que gostamos, deixa sempre um vazio na alma... resta-nos o cheiro a café, as frases, os sorrisos...
É a isto que chamamos saudade... é isto que constitui o nosso fado!
Nem sei porque me lembrei dela hoje e agora, talvez por causa deste link: Valeria Mendez

sábado, outubro 22, 2005

Cantiga da Carga

Chorai olhos, chorai olhos
As penas do Coração
As penas juntam-se aos molhos
Os Molhos deitam-me ao chão

Os Molhos deitam-me ao chão
Quase não consigo andar
Já me dói o coração
De uma vida a penar

Santo Antoninho da Serra
No cimo do seu Altar
Os senhores da Minha Terra
Matam-me a trabalhar

Subi ao alto do Monte
Para a lenha colher
Na água fresca da fonte
Vou chorar até morrer

cantiga tradicional madeirense

sexta-feira, outubro 21, 2005

Ilhas desconhecidas...

Turismo, álcool e açúcar têm degradado o povo e enriquecido alguns felizes da terra. O homem do Funchal, em contacto com o progresso, transformou-se em hoteleiro, engraxador e chauffeur.
E o povo? Os homens degenerados e raquíticos que todo o dia desfilam na rua diante de mim? Ponho em confronto o homem da Madeira com o dos Açores, o corvvino por exemplo, isolado do mundo e vivendo como há três séculos, e pergunto a mim mesmo o que lucrou com a civilização o habitante da cidade e o vilão? Lucraram os negociantes, os hoteleiros, afundam-se todos os outros numa abjecção que tem aumentado sempre. Cada vez se cava mais funda a separação entre as classes chamadas superiores e as outras. O que se faz neste país, é um crime que havemos de pagar muito caro!


in As ilhas Desconhecidas de Raul Brandão, 24 de Agosto de 1924



Estava eu arrumando alguns livros, quando deparei com este, "As ilhas desconhecidas" de Raul Brandão; são descrições pormenorizadas da vida e da realidade dos Açores e da Madeira, escrito em 1924. Salvaguardando as devidas proporções e o contexto da época, o espírito deste excerto é surpreendente pela actualidade que encerra.

segunda-feira, outubro 17, 2005


O primeiro post



Este é o meu primeiro post neste universo dos blogs...
E não podia ser senão sobre a Madeira, sim, sobre a ilha outrora chamada de Pérola do Atlântico; e digo outrora chamada, porque hoje em dia, com todas as mudanças e transformações sofridas aqui, duvido que tenha ficado alguma coisa da Pérola, e até mesmo o Atlântico já não é o que era!
Eu ainda sou do tempo em que o Atlântico, era Oceano e se enchia de brios nesta altura do ano! Galgava a Avenida do Mar, e chegava quase até à Casa da Luz (Empresa de Electricidade), agora amansou, já não galga coisa nenhuma e só deu cabo da Marina do Lugar de Baixo, porque se esqueceram de pôr o cimento todo na muralha...Se ele um dia se irrita e resolve mostrar a força que tinha, então ainda bem que vivo numa zona alta!
Mas voltemos à Pérola... Há quem diga que a Madeira cresceu muito nestes últimos trinta anos, eu pergunto cresceu como? O Pico Ruivo está mais alto? Nem por isso, antes pelo contrario, se calhar até lhe cortaram um pedaço; então será que está a ilha maior? Não me parece...
Então em que raio é que a Madeira cresceu? Terá sido em desenvolvimento? Temos agora mais industria? Produzimos mais? Outra vez a mesma resposta negativa... Bem, depois de muito pensar no fim de semana (sim, que durante a semana não me pagam para pensar...) descobri onde está o crescimento da Madeira! Aumentou o número de tuneis logo, a Madeira cresceu para debaixo da terra... O numero de Rotundas aumentou 60 vezes: Cresceu o nº de madeirenses a andar á roda... O numero de viadutos e pontes aumentou sei lá quantas vezes: Cresceu o numero de madeirenses a andar nas nuvens, ou será que andam a assobiar para o ar?

Tiber